quarta-feira, 30 de maio de 2007

DISTANTES

Três anos depois de algumas cartas de amor e nenhum beijo sequer, eles se reencontram pela Internet. Haviam se formado há três meses.

- Nossa! Você??
- ?
- Tudo bem?
- Olá! Tudo bem. E você?
- Opa. Saudades, hein...
- É mesmo. O pessoal faz muita falta...
- É.
- Ainda tem visto alguém?
- Sempre que posso, vejo uns. Muito de vez em quando, outros.
- Ah. Eu, quase nunca.
- Sei.
- Precisamos combinar um boteco e reunir todo mundo.
- Com certeza!
- No próximo sábado, então, é legal pra você?
- Muito bom!
- Vamos combinar.
- Eu fecho.
- Legal. Mas e aí, tá na TV ainda?
- Ah, sim, ainda estou... de pouquinho em pouquinho.
- Mas você fica!
- Tomara.
- É.
- Soube, aliás, que a sua empresa fechou e...
- Pois é. De repente.
- Sério?
- Não pude nem recolher minhas coisas. O oficial de justiça baixou e não quis nem saber.
- Que coisa, hein!
- É.
- Você tem que vir pra São Paulo, o momento é agora.
- Eu sei. Preciso ir, mesmo. Preciso me organizar.
- Faça isso.
- Vou fazer. Estou esperando as coisas se acertarem um pouco.
- Que coisas?
- Sei lá.
- Entendi.
- Você pensa em fazer uma pós-graduação?
- Pós enquanto não.
- ...
- Foi uma piada.
- Ah.
- Entendeu?
- Péssima.
- Pra lembrar os tempos de faculdade.
- Você não muda, mesmo.
- Mas e você? Pensa na especialização?
- Gostaria. Mas primeiro tenho que me acertar, né?
- Com o quê, exatamente?
- Não sei, exatamente.
- Ué...
- Com as coisas.
- Entendi.
- Pelo menos pós enquanto, então, fica difícil...
- HAHAHA. Boa!
- Ai, pra te dizer a verdade, tô cansada dessa vida de desempregada, viu.
- É foda...
- Além de tudo, estou engordando horrores!
- Ah, vá... que engordando, nada. Você está ótima na foto aí do lado.
- A foto é velha!
- Eu sei. Foi outra piada.
- Ah...
- É a foto de Campos.
- Ela!
- Viu?
- Oi?
- Eu lembro...
- Você já foi pra lá?
- Não. Eu lembro da foto, disse.
- Preciso ir.
- Pra lá?
- Pra onde?
- Pra Campos, ora.
- Não, né.
- Pra onde?
- Pra lá, que eu digo, é pra lá. Pra cozinha, pra sala, sei lá.
- Entendi.
- Sair disso aqui um pouco.
- Mas já?
- É.
- Ah.
- Ficar sem fazer nada cansa.
- É. Também vou.
- Ficar sem fazer nada?
- Não. Pra lá.
- Pra Campos?
- Não, né! Pra...
- Eu sei. Foi uma piada.
- Você não muda, mesmo.
- Olha quem fala.
- Eu? Ninguém muda.
- Verdade.
- Então...
- Beleza. Tchau tchau.
- Promete pra mim que nós vamos nos ver.
- Claro.
- E vamos combinar, pô!
- Vamos sim! No próximo sábado é perfeito...
- Fechado.
- Mesmo?
- Opa.
- Legal.
- Agora eu vou. Preciso ir.
- Ok, Beijos.
- Té mais.
- Sábado.
- Té lá.

No próximo sábado seria muito difícil, ele previu (com alguma culpa). Ela não iria de jeito nenhum, mesmo que ainda nem tivesse pensado nisso.

domingo, 27 de maio de 2007

Esse tal de ROQUENROU

Rock é música ou atitude? Os ponderados diriam que é uma mistura dos dois. Os rebeldes, com ou sem causa - há várias causas, faltam rebeliões -, diriam ser atitude. Os apaixonados acreditam que é música.

É que hoje a velocidade é outra, como disse o jornalista-cultural-que-está-em-todos-os-lugares Lúcio Ribeiro: “A velocidade da informação está beirando o absurdo. Quem fica parado dois segundos é poste. Sabe o disco do LCD Soundsystem que ainda nem saiu? Está velho. Lança outro, James”. Pois é, tanto para se desenhar uma trajetória quanto para descobrir – ou criar – novas bandas de sucesso, a velocidade atual é galopante.

Quando o vovô rock nasceu, há quase sessenta anos, conseguir um disco era uma odisséia para os ouvintes e saber o que faria sucesso era pisar em ovos para as gravadoras. Hoje, a questão não é saber o que faz sucesso, trata-se muitas vezes de criar o sucesso, direcionar o gosto do público e colocar a etiqueta poprock – junção que já dá uma boa medida do que o rock se tornou, não? Pop é o contrário de atitude, o contrário de revolução, o contrário de perigoso. É pop. Ou alguém acredita na rebeldia e nos cabelos cuidadosamente desarrumados do RBD? Na atitude de Avril Lavigne, a skatista com carinha de má mais bem maquiada e chapinhada da história?

Tá certo, exemplos fáceis. Mas as bandas-promessa se multiplicam como vírus de gripe! É Franz Ferdinand, Moptop, Klaxons, CSS, Bloc Party, Arcade Fire, Kaiser Chiefs, Clap Your Hands Say Yeah, Arctic Monkeys, Wolfmother, Dan Le Sac, Keane, Kassin (queeem?). Fale a verdade, pra acompanhar tudo isso não dá pra ouvir mais de 30 segundos de cada música nova, como naquele aparelhozinho que só toca um sample de cada música nas Fnacs. Ouvir uma música duas vezes então, nem pensar. Não dá tempo. Está velha. Não é que não haja coisa boa, claro que há, ou deve haver. Mas se perde no mar de informação, propaganda, tietagem, martelação, alarde, exposição, picaretagem, photoshop (de imagem e de som), estratégia, tempo de vida.

O rock já foi perigoso, lá quando as mães de adolescentes se apavoravam com os rebolados de Elvis (cujos discos gastavam e riscavam de tanto ouvidos), com as calças rasgadas e cabelos sujos dos Ramones, com a androgenia brilhosa de David Bowie, com o efeito que os Beatles tinham sobre suas filhas, com a revolução dos sentidos que os Doors proporcionaram. Não é saudosismo, é questão de timing. O movimento rock passou, o perigo se foi, sobrou a boa música. O jazz também já foi perigoso, quando os negros começavam a tomar espaço numa sociedade segregada, nas figuras de Glenn Miller, Billie Holiday, Louis Armstrong e Ella Fitzgerald – só quatro exemplos, pra tentar resumir o irresumível. Não é mais, é música para se ouvir com whisky e público seleto.

Perigoso é o que dá voz ao que era ignorado. Hoje, é o funk, é o rap, é música (?) que vem de quem tem com o que se revoltar: desigualdade social, na voz das minorias. Perigoso é filho de empresário ouvir que, para seu pai enriquecer, muita gente teve que empobrecer. Perigoso é filha de rico subir o morro porque a vida lá parece mais emocionante que ser mimada. Perigoso, no sentido de abalar as bases do cotidiano, é ver que aqueles que estão à margem da sociedade (como os negros estiveram antes do jazz, e os jovens antes do rock) estão ganhando espaço, pelo menos na discussão. E que o rock é o “grito da borboleta”, como cantou Jim Morrison em “When the Music's Over”.

quarta-feira, 23 de maio de 2007

Me apresentando-se

Não faço parte dos “quatro amigos”, que tiveram a idéia de criar o blog e colocar aí os seus textos, pra quem quiser ver. Vontade eu até tive, uma vez ou outra, de fazer algo desse tipo, mas, para o bem da verdade, me faltava coragem. Eu ia empurrando com a barriga, deixando pra “um dia”, quem sabe, o compromisso de escrever pra valer e, mais ainda, de permitir que as pessoas lessem - e gostassem ou desgostassem. Coisa que quem se mete a escrever sabe bem como é.
Quando me chamaram pra também escrever pro blog, foi como se, como num anúncio publicitário, alguém dissesse: “Helen, a hora é agora”. Até me imaginei sendo chacoalhada pelo “anunciador”. Coisa besta de quem tem mania de ficar matutando sobre tudo. Fiquei pensando em milhares de coisas, de implicações, mas aceitei, num misto de medo e euforia. Outra coisa besta, já que escrever em blog é coisa que muita gente faz, sem ser acometido de mal algum.
Por um lado, era bom saber que, por eu ter me comprometido a postar alguma coisa toda semana, eu finalmente desengavetaria aquela infinidade de papeizinhos que vêm sendo guardados ao longo do tempo, com projetos, inícios e trechos de contos, crônicas, poemas e sei lá mais o quê. Por outro, vinha o medo de ter que finalmente me sentar de frente pro computador e dizer: “Ok. Vou escrever, porque esse é o meu negócio”. E não escrever jornalisticamente, pra informar, denunciar, ou tentar mudar o mundo – delírios que jovens jornalistas costumam ter - mas, sim, escrever por escrever, o que me viesse à cabeça. Escrever o que me vem à cabeça já é tarefa difícil pra burro, porque a cabeça da gente parece que é uma coisa confusa que só. Publicar, então, é um feito. É como se eu colocasse o dedo no buraco da fechadura, não pra acabar com a graça de quem quer espiar, mas, isso sim, pra depois abrir a porta de vez e dizer: “Taí”.
Cada texto meu, cada rascunho, cada rabisco, por mais que trate de outras pessoas, ou de coisas que me são alheias, está carregado de mim. Dos meus sonhos, das minhas opiniões, dos meus medos, das minhas fantasias, dos meus delírios... Não há como negar. É um misto daquilo que eu penso sobre as pessoas, sobre o mundo, sobre mim mesma. Em cada palavra eu me denuncio. A cada palavra eu vou me achegando à luz dos holofotes e todos vão vendo com maior nitidez como eu realmente sou. E quando eu já estiver espremendo os olhos, por conta da luz forte, vocês podem descobrir que eu não sou em nada parecida com o que aparentava ser. Posso ser melhor ou pior. E vocês podem: ou dar de ombros, ou, se forem do tipo de pessoa que fica matutando sobre tudo, ficar matutando sobre isso. Agora, que resolvi escancarar a porta, não me importo.

Cada palavra de um texto não está lá por acaso. Cada palavra é escolhida a dedo, é pescada no meio de todas as outras, por melhor traduzir aquilo que até então apenas fluía, que até então era inominável. Quem pelo menos uma vez se decide a escrever, tem a difícil, mas excitante, experiência de transformar em palavras o que antes era pensamento, sentimento.

Já que vou me "desnudar" daqui pra frente, vou aos poucos... Um mini-conto:

Relacionamento

Olhando a mulher vestir-se, notou um roxo em seu braço. Não reconheceu.
-Ela deve ter outro homem!
Foi tirar satisfações.



quinta-feira, 17 de maio de 2007

DOIS GÊNIOS - INTRODUÇÃO

O que é ser genial? Ou, antes, quais são os fatores constitutivos da genialidade? Nos discursos individualistas e liberais a categoria gênio aparece como algo em si, ou seja, o gênio guardaria em suas características internas a explicação para sua própria existência. Desta maneira, este indivíduo aparece como alguém em separado do universo social e da história, distanciado das condições que o permitiram diferenciar-se e destacar-se da maioria, como o se o terreno do trabalho e do estudo aplicados para o desenvolvimento da intelectualidade, habilidades técnicas, destrezas, acúmulo de conhecimentos, sublimação de sentimentos, etc., fosse soterrado por uma série de variáveis metafísicas, como dom, talento, inspiração, isto é, qualidades inatas surgidas quase como um sopro divino.

Não quero afirmar que o aspecto do suor desapareça, mas ele é reduzido à quase inexistência quando a explicação dirige-se ao campo dos ímpetos e lampejos criativos surgidos diretamente da própria individualidade, como se houvesse uma separação entre homem (mundo) e o gênio (indivíduo único), e não uma relação. Este é o erro de muitos biógrafos, que centralizam suas obras a partir da perspectiva estrita, tanto psicológica quanto narrativa, do seu objeto de análise, acabando por desconsiderar o contexto, a formação e as condições históricas que permitiram a uma determinada pessoa realizar um certo trabalho.

A tese deste texto é: não é o indivíduo que determina a si mesmo, ou seja, não é o gênio que se constitui enquanto tal, mas uma série de fatores, tanto sociais e históricos quanto psicológicos, constituídos enquanto tensões, relações, conflitos e contradições que formam os sujeitos e determinam o escopo e a profundidade de suas ações, de sua intervenção no mundo. Da mesma maneira, essas características são parte da forma como os tidos gênios são encarados em cada momento histórico.

Para discutir este assunto, abordarei uma área que talvez seja a mais suscetível ao reconhecimento de gênios: a arte, neste caso, a música ocidental. Contudo, esta escolha acarreta um problema imediato: a música é algo natural, pois está presente em praticamente todas as sociedades conhecidas; ou artificial, ou seja, é uma ação do homem em relação ao meio (o som, a acústica, o corpo, a relação entre o movimento do eu e o objeto a vibrar), que, apesar de presente, diferencia-se em cada formação social?

Aposto na segunda resposta, pois qual a semelhança entre o canto xavante, os atabaques bantos, um canto cerimonial indiano e uma sinfonia de Beethoven? São música, não há dúvidas, mas um ocidental em meio à floresta mobilizaria os mesmos sentimentos que um xavante ao ouvir a canção entoada em uma cerimônia religiosa? Um banto da Nigéria teria um deleite estético da mesma forma que um berlinense ao ouvir a nona sinfonia? A música, apesar de guardar algumas características que a permitem ser classificda como tal, possui um componente social muito marcante, diferenciador do modo como uma sociedade possibilita ao compositor sublimar sentimentos e fantasias em algo passível de ser apreciado e sentido por seu grupo, ademais, adquire ao longo da história uma lógica própria, uma maneira específica de relação com a razão, quase como uma gramática de uma língua (imaginem, leitores, uma escala feita em um piano, se o pianista deslizar e tocar apenas uma tecla errada ou a mais, vocês não sentiriam um quê de desarmonia nos ouvidos? ).

Julguei dois compositores emblemáticos para abordar este tema: Bach e Mozart. O primeiro motivo é óbvio, são geniais, ou, mais especificamente (dentro das intenções do texto), são considerados geniais atualmente, dotados de uma aptidão rara para a composição e a execução musicais. Bach demorou décadas para ser reconhecido enquanto tal, apesar de praticamente fundar na polifonia a relação entre harmonia e contraponto e levar ao extremo as fugas, foi criticado muito tempo por possuir traços ditos arcaizantes, oriundos da música medieval. Porém, foi resgatado por alguns compositores românticos e alçado à categoria de gênio no século XX. Deixarei os detalhes deste debate para a terceira parte deste texto.

O segundo motivo para a escolha destes músicos foi o momento histórico em que viveram, no qual a música ainda não era uma arte de artista, mas uma arte de artesão. Os detalhes destas categorias sociológicas serão discutidos na parte sobre Mozart, mas apenas para informar rapidamente ao caro leitor minhas intenções, farei um breve resumo comparando estes dois a um compositor de outra época, Beethoven.

Bach e Mozart produziram em um período no qual o gosto era exterior ao artista, isto é, o que era belo era ditado pela nobreza cortesã (e em última instância pelo príncipe). O músico era de vital importância, pois provia o entretenimento para os nobres avessos ao trabalho manual, mas possuía o mesmo status social de um cozinheiro. Como não trabalhavam na produção, os membros da corte atribuíam-se o trabalho de ouvir e avaliar as composições, por menos que soubessem de música, obrigando os artistas, para serem consagrados, a respeitar determinadas regras na hora na composição. Mas, mais profundamente, este quadro refletia a situação social do músico: era um não-nobre, por melhor que fosse, seria sempre um serviçal, deveria produzir sonatas, cantatas, concertos, sinfonias e óperas como o cozinheiro preparava os banquetes, correndo sempre o risco de o nobre enjoar do tempero. Bach viveu assim em uma das épocas mais duras – em relação ao gosto estrito - do mecenato, sua estratégia, consciente ou não, foi buscar na transcendência religiosa dos temas uma forma de superação das amarras impostas a sua música.

Já Mozart, como menino prodígio, possuía certo reconhecimento em diversas cortes européias, mas isto não foi o suficiente para ele se firmar como artista autônomo. Diversas de suas transgressões à música de corte foram aceitas, mas isto não significou um rompimento com esta forma. Porém, sua atitude avant-la-lettre o colocou à margem das instâncias de consagração de Viena, provocando a depressão que antecedeu sua morte.

Aqui, o contraponto é Beethoven, que começou a compor à época da maturidade de Mozart, mas viveu seu auge em uma fase de ascensão econômica da burguesia, acompanhada de certo ganho de prestígio social, enquanto na França, concomitantemente, esta classe alcançava o poder político. Isto representou um aumento gigantesco de um mercado de música – óperas passaram a vender ingressos ao público em geral, o comércio de partituras e instrumentos se expandiu -, significando uma mudança na relação entre o produtor e o consumidor de arte. O músico passou a interagir com um mercado mais amplo - o público burguês era maior em número e mais diversificado- e não apenas com um tipo de empregador que determinava as regras. Tornou-se possível compor mais livremente e ao artista estimular e influenciar o gosto do público. Beethoven conseguiu realizar sem grandes conflitos o projeto de autonomia que Mozart tentou sem sucesso. Pôde, assim, subjetivar sua produção, de maneira mais livre tanto na forma quanto no conteúdo e no método de trabalho, com a possibilidade de escolher o consumidor final e com acesso a um maior número de libretos, apesar de ter composto poucas óperas. A arte passou a depender mais do modo como o artista encarava suas fantasias, como questionava a si mesmo e ao mundo e como subjetivamente produzia e sublimava na forma de obra de arte do que do gosto de classe, ou seja, dependia de como sua consciência sublimada encontrava eco ou fazia ecoar as estruturas simbólicas de sua sociedade; a autoconsciência passou ser mais determinante do que os dogmas da tradição. É interessante o fato deste processo ter ocorrido anteriormente com a literatura na Alemanha, que, muito antes da música, constituiu seu mercado de bens culturais.

Portanto, Bach e Mozart podem melhor ajudar a compreender como os fatores históricos e sociais estão relacionados com a produção musical pois viveram uma época em que os sentimentos deveriam ser canalizados por um critério puramente de classe, no qual não havia sentido pensar a arte pela arte. Mozart pode ter sido um indivíduo com alguma qualidade especial inata, mas a forma como ele utilizou esta qualidade na música foi determinada também pelo seu contexto histórico-social.

Deste último aspecto, derivarei o terceiro motivo de minha escolha: o caráter quase mítico adquirido por Mozart. Nas histórias e frases que ouvimos, como “Mozart é a própria música” ou “Mozart estava conversando com amigos e ficou calado por alguns instantes, pediu licença e voltou quinze minutos depois: acabara de compor um quarteto de cordas”, (inclusive, muitos fatos excepcionais, como este último, estão registrados em correspondências de amigos e da família do compositor), este caráter de um homem acima dos homens pelo seu gênio singular é marcadamente expresso, possibilitando uma análise mais clara – pela força do objeto – e desmistificadora, mas não no sentido de diminuir o autor e a obra, mas de valorizá-los como trabalho humano, e não como fonte dos deuses ou orixás, santos, ou qualquer instância sobrenatural.

Antes de se afirmar se o gênio de Salzburg nasceu diferente dos demais seres humanos ou se ele se construiu de forma distinta, é preciso deixar claro que muitos se aventuraram, mas poucos conseguiram alguma resposta. As análises basearam-se em fatos documentados e em séries de correspondências, mas, segundo críticos, ou chegaram a becos sem saída pela insuficiência das fontes existentes ou pecaram pela mesma mistificação aqui criticada: tentaram explicar o homem, mas “esqueceram” de compreender o mundo vivido.

Então, o que é o talento? A psicologia pode não ter desvendado a natureza de muitas questões relativas à sensibilidade, à capacidade de transformar as sensações internas na materialidade da obra artística – a objetivação das estruturas sentimentais – ou das indagações relativas ao caráter congênito ou adquirido dessas potencialidades. No entanto, é possível refletir rapidamente sobre o exemplo acima tratado através de perguntas simples: seria Mozart um grande compositor se não tivesse nascido numa família de músicos, escutado desde o berço o pai – professor tido como brilhante e perfeccionista – dar aulas de piano à irmã e aos três anos tocar pela primeira vez as teclas para rivalizar com a menina e receber as mesmas gratificações afetivas de seu progenitor? Se não tivesse excursionado pela Europa ainda menino, recebendo mais carinho do pai e paparicos dos membros das cortes anfitriãs quanto melhor tocava e nestas viagens ter tido contato e aprendido com músicos como Haydn? Se ele não se formasse intelectual e emocionalmente em um círculo social no qual a música era a única e pequena possibilidade de ascensão e prestígio social? Ou, se a sua relação com o mundo não tivesse sido tão fortemente mediada por um pai disciplinador, que estruturava o afeto entre pai e filho pela música?

São dimensões extremamente complexas de serem trabalhadas e não me proponho a qualquer solução, contudo pretendo utilizá-las para conduzir o questionamento central deste texto. Quero apenas instigar o caro leitor a imaginar até que ponto nosso próprio juízo sobre estes gênios criadores não está influenciado pelo individualismo de nossos dias e se, desta maneira, nós não ocultamos a História e criamos mitos para justificar ideologicamente nossa própria alienação, o apartamento de nós mesmos por forças incontroláveis; a pensar se esta forma de encarar as relações sociais e os homens não é fruto de um pensamento tipicamente reacionário, cuja reprodução está presente nos discursos mais cotidianos (mas que passam despercebidos), e, finalmente, a dar elementos para um debate neste blog acerca própria produção contemporânea.

Caros leitores: para quem chegou até aqui, farei algumas observações:

1 – O texto ficou muito grande para um blog, então eu o desmembrei em três:

1.1 INTRODUÇÃO: A primeira parte, postada acima, teve o intuito de situar o leitor na discussão que desenrolarei ao logo das partes, os problemas a serem debatidos e propor alguns questionamentos relativos ao individualismo de análise..

1.2 O HOMEM-ARTISTA MOZART: Nesta segunda parte, pretendo discutir alguns pontos da biografia e da obra de Mozart a partir de uma perspectiva sociológica (com algumas sugestões de análise psicológica). Por exemplo, como era sua relação com seus empregadores e com seu pai. Qual a diferença entre se produzir arte de artesão e arte de artista. Como o artista lidava com as instâncias de consagração e de prestígio social de sua época. Se sua postura combativa tinha um viés político ou se era motivada por ambições pessoais e o que implicou seu rompimento com o arcebispo de Salzburg e sua ida a Viena. E porque fracassou seu projeto de autonomia.

1.3 O OUVINTE DE BACH NO PÓS-GUERRA e a CONCLUSÃO: Nesta parte, quero apontar aspectos do público ouvinte das obras de Bach após a segunda guerra e tentar produzir algumas pequenas generalizações no sentido de evidenciar como o contexto histórico do público interfere na execução e na interpretação de uma obra, como determinados juízos históricos acerca da reprodução de uma música podem produzir o contrário da pretensão do artista. E na conclusão pautar-me-ei pelo aspecto político do discurso individualista presente no discurso do gênio.

Observações para todas as partes do texto, mesmo as não postadas:

1 – Sr. Crespo, desculpe-me, mas não consigo não ser ranzinza.

2 – Não colocarei a bibliografia com o risco de, além de ranzinza, ser chato.

3 – A melhor forma de ler este texto é não ler este texto, mas comprar um bom vinho e ouvir a Sinfonia Júpiter de Mozart ou as 6 Suites de Violoncelo Sem Acompanhamento de Bach.

4 – Como um jornalista não-jornalista e pretenso sociólogo, mas ainda um não-sociólogo, declaro: este texto possui grandes generalizações, porém o Ministério da Informação adverte: foram causadas pelo formato blog.

5 – Antes que alguém pergunte: não, as categorias burguesia e corte não possuem qualquer significado valorativo, moral ou religioso, mas objetivo. E sim, são vistas a partir do ponto de vista do materialismo histórico.

6 – Vamos tomar uma cerveja e ver o tempo passar? Afinal, quem escreve poesia não é poeta, só é poeta quem vive como poeta. Beberemos cerveja, pensaremos que somos poetas, mesmo não o sendo. Viva a ilusão etílica. Viva Baudelaire. Qui dit vous?

Observações sobre o blog:

Parafraseando (ou melhor, copiando) o Regulamento Rex (publicado em Rex Time 3, de 25 de maio de 1966), proponho algumas regras para este blog:

1 – Laisser-passer (não fure a bola)

2 – Laisser-faire (deixa a gente jogar)

3 – Acreditar piamente na imortalidade da Alma (por uma questão de conforto)

4 – Manter o Bom-Humor a todo pano. (... o Bom-Humor nosso, não o dos outros)

5 – A Pena e a Espada dominam o Mundo, a Vaselina supera as duas. (Atualmente já existe o KY)

6 – Eu sou um cavalo velho, que venho de todas as guerras e batalhas, e não estou ligando para mais nada.

7 – Nós vemos tudo, ouvimos tudo, falamos tudo e eles não vêem nada, não ouvem nada, e não dizem nada (a não ser o que todo mundo sabe).

8 – A vida é feita de detalhes (ou nuances, como queira).

9 – Uma coisa puxa a outra. (Acrescento: tirar a calça tem sempre uma conseqüência)

10 – Toda a Guerra é uma festa. Toda festa é uma guerra.

11 – Quando todos estão brincando, nós estamos trabalhando, e quando todos estão trabalhando, nós estamos dormindo!

12 – Nada se cria, nada se perde, e dá tudo sempre na mesma, e vamos acabar com esta conversa, seu convencido!

segunda-feira, 14 de maio de 2007

TEORIAS DA CONSPIRAÇÃO

A imprensa não é mais a mesma (não diga “ah, vá!”, ainda). Durante o século XX as mudanças nos jornais já foram enormes, com a diminuição dos textos, o apego a fatos pontuais e descontextualizados e o aumento da utilização de fotografias. A popularização da televisão parecia ameaçar a mídia impressa. Na última década, porém, essas mudanças foram astronômicas, com o advento da internet e tudo o que ela engloba. As teorias da conspiração surgiram junto com a avassaladora velocidade dessas mudanças e o tanto que elas afetam nossa vida cotidiana. Quanto tempo por dia você passa lendo e respondendo e-mails? E procurando vídeos no YouTube? Fuçando na vida alheia pelo Orkut? Conversando pelo MSN? Fazendo trabalhos com a ferramenta de busca do Google? Já trocou as lojas físicas pelas online? Hmmm...

Há três anos, o jornalista Matt Thompson produziu um vídeo de oito minutos que virou fenômeno de audiência, de paranóia, e de discussão. Basicamente ele conta como o Google englobou o mundo e se fez necessário, único, dando conta da vida de todos em todos os aspectos: perfil social, amigos, família, relações, opiniões, desejos, compras, trabalho, informação, etc. Controlando todos esses aspectos, já em 2014 a empresa Google teria como puxar um perfil detalhado de cada um, para o bem ou para o mal. Dê uma olhada no vídeo (http://epic.makingithappen.co.uk/) ou leia abaixo um resumo da estória (ou história? – algumas previsões já se realizaram). Se não quiser os detalhes, pule as estrelinhas e siga pela estrada de tijolos amarelos.

***

EPIC, 2014

Em 1989, Tim Berners-Lee concebe a World Wide Web. Em 1994, a Amazon inicia suas atividades como uma loja que vende absolutamente qualquer coisa e consegue até fazer sugestões automáticas personalizadas para seus usuários. Em 1998, o Google é criado por dois estudantes da Universidade de Stanford, com a promessa do mais rápido e efetivo sistema de busca do mundo. Em 1999, a TiVo muda a concepção de TV, libertando-a dos grilhões do tempo e da publicidade – você escolhe o que quer assistir e a que horas quer assistir, sem intervalos. No mesmo ano, o Blogger, uma ferramenta para qualquer um escrever o que quiser sobre o que quiser, é fundado. O Google vai se desenvolvendo rapidamente e cria, entre outras coisas, o Google News, um serviço único que não necessita da intervenção humana: é completamente editado por computadores. Em 2002, o site Friendster é lançado, algo como uma primeira versão do Orkut, em que as pessoas preenchem detalhadamente seus perfis pessoais, colocam fotos, juntam seus amigos e interagem.

Em 2003, o Google compra o Blogger. Em 2004, cria o Gmail, colocando no chinelo o rival Hotmail, da Microsoft. O Google começa a digitalizar os acervos de bibliotecas, e compra o Keyhole, que vira Google Earth, uma companhia que mapeia o mundo através de satélite. A revista Reason manda para cada assinante um exemplar com uma foto de satélite da sua casa na capa e informações personalizadas no miolo.

(Lembre-se, de agora em diante, são suposições do autor; ele fez o filme em 2004).

Em 2005, a Microsoft compra o Friendster em resposta ao Google. A Apple cria o WifiPod, que permite aos usuários mandar e receber mensagens instantâneas (bem, o celular já faz isso).

O Google, com tudo o que já possui, cria o Google Grid, uma plataforma universal que oferece espaço ilimitado para o usuário guardar qualquer tipo de arquivo e escolher o quê quer manter privado e o quê deseja tornar público. Em 2007 a Microsoft cria o Newsbotster, uma rede de informação social que seleciona notícias para cada usuário baseada no que seus amigos e colegas lêem, e permite que qualquer um comente sobre o que vê.

Em 2008, o Google e a Amazon se fundem, formando o Googlezon - a primeira oferece seu Grid e a segunda oferece as informações personalizadas. Googlezon é um sistema de procura automática em todas as fontes de conteúdo; ele proporciona, baseado nas informações pessoais adquiridas, as informações que julga interessar ao usuário. É uma máquina que pensa e decide por nós.

Em 2010, a guerra da informação explode entre a Microsoft e o Googlezon. O mais curioso é que essa guerra não envolve organizações reais de produção de notícias. No ano seguinte, o Quarto Poder emerge para fazer sua primeira e última intervenção: O “New York Times” processa o Googlezon sob a alegação de que “os ‘robôs de despir fatos’ violam a lei de propriedade intelectual”. O jornal perde.

Em 2014, a Googlezon cria a EPIC (“Evolving Personalized Information Construct”), algo como “Construção da Informação Personalizada em Desenvolvimento”, que paga aos usuários (ou seja, todo o mundo) para contribuírem com qualquer informação no grid central, permitindo que o sistema selecione e dissemine notícias customizadas, sem a interferência de jornalistas – ela aleatoriamente retira partes de textos e troca com outras partes de outros textos, mudando as histórias de acordo com o gosto de seus usuários, formando um produto totalmente individualizado. Os arquivos da EPIC não categorizam apenas notícias, mas informações demográficas, visões políticas e hábitos de consumo de cada um. No seu melhor, a EPIC é um sumário do mundo, maior, mais abrangente e específico do que qualquer outra ferramenta existente. Por outro lado, a EPIC é meramente uma coleção de trivialidades, muitas falsas, e todas limitadas, rasas e sensacionalistas. As empresas de mídia tradicionais vão à falência uma a uma, e a última que sobra, o “New York Times”, sai da Web para virar uma newsletter impressa para a elite.

“Mas era isso o que queríamos, não?”, questiona o autor.

***

A ESTRADA DE TIJOLOS AMARELOS

O vídeo da EPIC, embora um pouco exagerado, mostra uma seqüência de acontecimentos que já está em curso. Não acredito que a História será reescrita, assim orwellianamente, virtualmente, mas estamos cada vez mais dependentes do mundo virtual, em detrimento do real. Estamos em plena era da informação, recebendo partes de notícias pelo celular, pelo rádio, pela televisão, pela internet. Os jornais criam novos projetos gráficos, para otimizar a leitura; lemos muitas vezes apenas as manchetes nos portais da internet; vemos um pedaço do noticiário na TV antes de mudar de canal. A pressa dos leitores muda a maneira como os escritores escrevem. São sempre lampejos de um fato, nunca – e cada vez menos – o contexto, causas, conseqüências. Estamos perdendo a dimensão do todo.

Uma verdade descontextualizada é quase tão nociva quanto uma mentira.

Não bastasse essa escassez de completude, qualquer pessoa pode publicar o que bem entender na Web, sem maiores conseqüências (a Lei ainda não descobriu um meio efetivo de julgar internautas). Isso é bom por um lado, porque não deixa a voz das opiniões permanecer com os acadêmicos, técnicos e renomados. Por outro lado, empesteia os WWWs de bobagens, equívocos e mentiras maquiadas de verdades. Quem decide o que é o quê?

Blogs pessoais, Fotologs, Perfis de Orkut, gente se desnudando (não só fisicamente) na Web. E agora, a última são os “twitters” (palavra originada de “twit”, o som dos passarinhos), pessoas que postam na internet tudo o que fazem o tempo todo, geralmente através de celulares. Coisas do tipo “saí de casa”, ou “cheguei ao shopping”, ou “estou parado no trânsito”. Textos minúsculos, que não podem ultrapassar 140 caracteres, sem interesse algum para qualquer um que não seja quem está postando ou quem está vigiando quem está postando.

As teorias da conspiração podem até ser exageradas (ou não; você já reparou que as propagandas do lado direito do seu Gmail sempre utilizam como base alguma palavra usada nos seus últimos e-mails?), mas apontam para o caminho aparentemente sem volta da desinformação em plena era da informação. E agora, quem poderá nos defender?

sexta-feira, 11 de maio de 2007

Loucurações (sobre qualquer coisa)

Sofro de uma doença estranha. Embora a palavra doença soe carregada, ainda mais para a primeira linha de um texto, esta minha doença, creio eu, seja digna de risos, não compaixão. É curiosa, anormal, singular, e... estranha. É algo relacionado a outras doenças. Fui uma vez ao médico tratar um problema de estômago. Após três meses de tratamento voltei para dizer que de nada adiantou. A dor persistia. O médico disse que eu estava louco. Quis dizer que a minha doença, a relacionada ao estômago (!), deveria me levar ao psicólogo. Nunca mais voltei ao médico.

Tenho uma espécie de antropofagia cultural às avessas. Invés de incorporar o que há de bom nos outros, hospedo seus pequenos defeitos. Uma vez descobri que um amigo não conseguia engolir comprimidos. Em algumas situações ficava internado com tubos e tubos de soro para se recuperar de problemas que a ingestão de alguns comprimidos resolveriam. Eu nunca tive problemas com isto e debochei do coitado. Hoje sei que ele superou este trauma, e engole, se preciso, 5 (CINCO) enormes (ENORMES!) drágeas de uma só vez!!! Eu, em compensação, desde então preciso mastigar para conseguir engolir diariamente um minúsculo remédio para dor no estômago.

Após este fato andei pesquisando sobre pessoas neuróticas e estava quase me diagnosticando, até descobrir que para Freud todos são neuróticos, ou então, perversos. Ok, sou neurótico e não falemos mais disto.

Mas vejo que ainda não expliquei exatamente sobre o que consiste esta minha doença estranha. É uma espécie de doença de Zeno, de quem agora vou falar para que entendam o problema.

O livro A Consciência de Zeno, de Italo Svevo (1861-1928), conta uma história não linear. Já com certa idade, o personagem Zeno resolve ir ao analista para rever sua vida. A narrativa dá passagem a primeira pessoa nos relatórios escritos por Zeno, quando o médico o aconselha a lembrar e escrever episódios marcantes de sua vida. Assim, ficamos sabendo sobre seus fracassos amorosos, o trabalho que não lhe trazia satisfação, e suas tentativas frustradas para mudar de vida. Seria dramático, não fosse hilário. Pois ora, a memória é incerta, e nem sempre sabemos se aquilo realmente aconteceu. Zeno tem uma visão afastada sobre cada episódio vivido. Ele mesmo não sabe como julgar cada situação do passado, e muitas descrições tornam-se patéticas.

Contudo, o humor fica por conta das manias do personagem, que se apresenta como um típico sujeito neurótico, cheio de cismas que se transformam em doenças das mais bizonhas – como eu. Ao se reencontrar com um antigo amigo, começam a conversar sobre um problema que este tem na perna. Conversam algum tempo sobre o tratamento do outro. No final da conversa, Zeno volta para casa mancando.

Claro que agora, quem chegou até este ponto do texto, pode estar ansioso para entender duas coisas. Primeiro: aonde eu quero chegar com isso? Segundo: saber se eu adquiri essa doença ao conhecer sua existência lendo o livro. A primeira será respondida naturalmente, no decorrer do texto (ou não). Já com relação à segunda, se você realmente fez essa pergunta, então meu amigo, você está a um pequeno passo para adquirir esta doença também. Pois para este complexo capcioso, basta pensar em não possuir determinado problema e...pronto! Acontece. É um inconveniente terrível, que pode acontecer com qualquer um. Estimativas indicam que até o ano 2035, mais de 35% da população mundial sofrerá deste mal.

Ah, esqueci de mencionar que também tive contato com pessoas mitomaníacas. Acontece...

terça-feira, 8 de maio de 2007

UZOUTROS

De muito pequeno que, vira-mexe, sou reprimido com o pavor dos mais sábios: “O que é que os outros vão pensar?”. O dilema, claro, nem sempre é tão explícito, primeiro porque já não tenho idade para engolir esse infantilismo cínico e segundo porque quem o faz admite, ainda que para si mesmo, a fraqueza de seu próprio medo.

Natural, pois, que eu tenha crescido odiando “os outros”. Mesmo que eu nem soubesse quem eles eram, de fato. Uzoutros, para minha imaginação meio medrosa e meio desafiante, era instância máxima coercitiva, fantasma de pequenos sapecas e contraventores dos deveres de um bom menino. Até meus doze anos, Uzoutros me “fazia” sentir culpa de mim mesmo. Oh, papai do céu, eu era um malcriado e haveria de ser banido do mundo pel’Uzoutros. Rezava para que Chapolim acabasse com ele antes que ele acabasse comigo.

Não aconteceu nenhum dos dois. Mas hoje, mais lúcido e menos medroso, eu sei que não era nada daquilo, sei perfeitamente quem são eles. Os outros estão à nossa porta, à nossa espera para preencher suas vidinhas repletas de valores estúpidos e insignificantes; são o retrato da hipocrisia e da petulância vigentes em toda a pompa do nosso círculo social.

Os outros são os fúteis, os mesquinhos, os andarilhos da classe média guiada por rédeas. Os outros são aqueles que escreveram a Bíblia, aqueles que a lêem e que depois vomitam o falso moralismo cristão para cima de nós, pobres invólucros de pagãos sofredores. Sob o olhar e a vigia sanguinária dos outros, somos penitentes sem causa.

Os outros são os racistas (in) conscientes, os homofóbicos orgulhosos que desfilam sua ignorância e que, nossa!, são machões que não choram e não usam brincos nem piercings. São donzelas que trepam em silêncio (ou não trepam), mas urram e cospem para o alto com o grande orgasmo do fetichismo à vida alheia.

*O corretor ortográfico do Word sublinha a palavra “trepam”, pede para que eu corrija a expressão escrevendo “têm relações sexuais”. Educadíssimo, este programa. Os outros são o Word.

Os outros são aqueles chocados com o realismo perverso de Nelson Rodrigues e com o vandalismo sem perigos do rock; são aqueles que se incomodam porque estão abaixo do nosso presidente analfabeto e proclamam com toda seriedade e raiva “ele é tão burro que perdeu um dedo”. Os outros são os elitistas de terceiro mundo, arianos de sangue azul enojados com a falta de modos dos pobres; são os donos das televisões e os editorialistas destes jornais e revistas ditos grandes.

Os outros são os vizinhos do andar de cima, de baixo, de muro, de janela nos condomínios fechados e espremidos. Arquétipos da conduta reacionária e “sociável”, “civilizada”. Aqueles que não falam palavrões ou, se falam, “só dos mais leves, de veeeez em quando”. Os outros não falam “buceta”. No entanto, têm a cabeça encaralhada e fodida o tempo todo. O tempo todo.

Os outros são, sim, clichês. Ambulantes e desqualificadores de coisas e gentes. Os outros são aqueles que riem do que eu escrevo, da minha baixaria gratuita. Eles me acham mal educado...

Os outros são os donos da verdade; são eles que julgam o certo e o errado. Mas calma lá: os outros não julgam suas próprias atitudes, mas apenas as... dos outros. É uma loucura. Pior que isso: os outros se guiam pelos outros. Justamente por essa paranóia toda é que nunca, ou muito raramente, existem os “nós mesmos”.

Os outros estão do lado de dentro da nossa porta, mas ainda assim insistimos em tratá-los como estranhos, donos de uma mão invisível smithiana. Como uma terceira do plural indefinível. Os outros são assim. O mais perfeito retrato de – quase - todo mundo.

segunda-feira, 7 de maio de 2007

BEM, AMIGOS...

"Se eu fosse o árbitro, ignorava o bandeirinha e dava gol legal. Não importa se o jogador está impedido, se foi de mão, se ele fez falta... gol bonito tinha que valer de qualquer jeito!"


Casagrande, mostrando que nossos árbitros poderiam ser piores.

(São Paulo x Grêmio, Taça Libertadores, depois de um gol de Dagoberto corretamente anulado).

sexta-feira, 4 de maio de 2007

TARDE

Tarde leve tarde
Pesado é seu tédio
O sol sobre os ombros daqueles que passam
operando o dia, engrenando as feridas
Nada significando para aqueles que vêem
A vida passar

Agora espero, agora calo, agora fujo
Aguardando sóis ilusórios se porem
Pois a juventude é a aurora distante
E o vazio é repleto de mim mesmo

Quando um dia o laço obtuso
e robusto
Enforcar-me a razão
E as garras do mundo penetrarem minha alma
As tardes deixarão de ser tardes

Serão a espera que hoje não tenho
Pois o então trabalho dos homens
Há de me separar de mim
Uma parte de saudades
do tempo da contemplação
Outra do eu em solavancos desmembrado

Hoje, impregnado de sentimentos esparsos
como espectador da estética dos fatos,
Reluto em aceitar esta úmida brisa
Que reconforta sem revigorar as forças
É devaneio, é logro, é quimera

Este suave vento jovial
Dá-me certezas inexistentes
Pois sei que só contemplo
Sei que paro
Sei que alucino
Sem parar a roda da História

E se posso ficar inerte
Se falo ou se calo
Ou vejo as fantasias defronte minha face
Não é porque posso
É porque me foi permitido querer

Desmaterializa-se a tarde
As árvores, a rua, o sol, a relva
Só resta a gente
E toda a gente do mundo
Porque não sou mais manhã
Desvaneceu meu dia

Neste momento também suo
Sofro, sangro, salivo
Não pela recusa da tarde
Mas pelo NÃO
Recuso sem recear
A aceitar a materialidade
da máquina do mundo.

quinta-feira, 3 de maio de 2007

SHOWS & shows

Pet Shop Boys, Roger Waters, Aerosmith, Jethro Tull (acho que não esqueci de nada, né?). Esses foram os maiores shows que passaram pelo Brasil no começo de 2007, mais um ano que promete grandes atrações internacionais, com uma coisa em comum: a “geração do que sobrou” agradece. Explico: são artistas que tiveram seus auges há pelo menos duas décadas, e hoje sobrevivem de uma época que se foi. Os nostálgicos – eu incluída – se deliciam.

O show de Roger Waters, com quase 3 horas de duração, foi fabuloso. Uma combinação de imagem, som, performance, beleza, produção, conforto, repertório, clima, porco... Porco? Um balão gigante em forma de porco rosa com escritos subversivos rondou o estádio e depois foi solto no espaço, subindo até desaparecer no céu raramente claro de São Paulo – dava pra ver umas dez estrelas! Um astronauta solto sobre a platéia, um prisma de laser, a lua que se aproximava e se afastava parecendo sair do telão, sangue acelerando e correndo nas veias no ritmo da música, que dançava pelo estádio. Melhor tentar trazer as imagens para descrever o indescritível. Todos os detalhes minimamente trabalhados; cada música era um espetáculo à parte.

Ah, teve o Coldplay também este ano. Opa, eu estava falando de bandas antigas. Incrível como uma banda tão nova pode parecer tão surrada. É rock? Não, não é. Foi um show de gente pop, colunáveis, mulheres de maquiagem carregada e salto alto e homens de camisa e sapato querendo ver (isso mesmo, ver) música quadradinha que ora ou outra explodia em ânimo. Ah, tinha fãs também, mas só aqueles que conseguiram juntar o valor salgado do ingresso. Iluminação perfeita, lasers coloridos, banda bonitinha, músicas criadas em cima de um estilo de sucesso repetitivo. Fórmula.

Pet Shop Boys, que deveria ter sido um show altamente dançante e explosivo, se fez lounge, com performancezinhas meia-boca e palco sem-graça. Aonde foi parar a discoteca? O show, que durou uma hora e vinte minutos (!) começou morno (bocejos na platéia; espaços abertos na boca do palco) e explodiu – de leve – no final. “It’s a Sin” empolgou o público sedento pela dupla que veio ao Brasil apenas pela terceira vez em mais de vinte anos de carreira, mesmo sendo executada de maneira programática. “Go West” idem. “Always on my Mind” ibidem. A apatia – e o cansaço das próprias músicas - da dupla inglesa ficou marcada nesse show (caro, para variar), e apenas foi diluída no atendimento aos gritos do público que pedia um segundo bis... “Being Boring”. Irônico não?

***

Não existe uma estrutura para shows no Brasil; a negociação entre empresários, casas de espetáculos, publicidade e artistas é perversa por aqui. Se nos Estados Unidos, por exemplo, existe uma agenda confiável para o ano inteiro com grandes shows e inúmeras casas de shows, cada uma perfeita e equipada para cada tipo de performance e produção (palco largo e mesinhas para aquele jazz ou psicodélico para se ouvir sentado bebendo um whisky ou vinho; ou pista inclinada com espaço e visibilidade geral do palco para o rock ou o pop dançante de ficar de pé com cerveja e cigarro na mão etc) – e por preço acessível, viva a concorrência! – aqui o público espera carente pelos ídolos, o que abre portas para o showbusiness negligenciar as produções. O Credicard Hall, que tem trazido a maior quantidade dessas atrações internacionais, peca pelo som – cadê a acústica? –, que fica baixo para quem está a mais de dez metros do palco, peca pela produção genérica (onde estão os telões com câmeras variadas, a iluminação condizente com o som, o colorido, o clima?) e deixa no ar um cheiro de desleixo. Parecem pensar – e agora não estou falando apenas do Credicard Hall – que, como já estão trazendo alguém grande e que já não aparece em terras tupiniquins há anos, não precisam se preocupar com o capricho, pois o público aparecerá e pagará o qualquer preço da mesma forma. E estão certos.

E depois de tanta burocracia por ingressos caros, pontos de venda frescurentos, taxas de conveniência, partos por uma meia-entrada, produções impróprias e descuidadas e shows-cumprição-de-tabela (muitas vezes também por parte dos músicos, é verdade), dá até preguiça de se empolgar com o que vem por aí.

Gosto muito de Aerosmith (dos primeiros discos), mas não fui ao show, por tudo o que mencionei acima. Imaginei Steven Tyler e Joe Perry, com seus últimos trabalhos medíocres, querendo emplacar músicas novas, tendo que tocar as baba-ovo “I don’t wanna miss a thing” e “Jaded” para as menininhas iniciadas na fase pop dos roqueiros, e agradando com as mesmas músicas que tocam há décadas e que já devem sair automaticamente de suas mãos e bocas. Meus amigos que foram dizem que perdi um grande show, mas, bem, eles também se enquadram na categoria “público carente da presença de seus ídolos”.

O Jethro Tull, que eu já havia assistido sentada curtindo o progressivo com uma caipirinha de limão, em 2000, no Via Funchal (aliás, uma casa que parece conhecer o que traz e se preocupar em criar um ambiente condizente com a atração), voltou agora em abril com uma violinista e um repertório com muitas omissões importantes (onde estava “My Sunday Feeling”?), que mais parecia feito para aproveitar a presença da menina virtuosa. Foi no Credicard Hall, em pé, sem qualquer inclinação na pista que permitisse aos mais afastados verem o palco por cima das cabeças. Ouvia-se a conversa dos grupos e a cantoria dos desafinados em volta durante a apresentação. “Aqualung” estava tão mudada que só era reconhecível nas três rápidas repetições do riff, em 7 minutos de improviso. Ian Anderson é um showman, culto, interativo, divertido e alerta. A iluminação parecia a de uma sala de palestras, não fossem as duas ou três vezes que uma luz colorida psicodélica projetou formas repetitivas no fundo do palco. Valeu? Valeu, teve quatro ou cinco momentos marcantes e foi talvez a última oportunidade de vê-los.

***

Existem várias maneiras de se julgar um show e, voltando ao Roger Waters, a crítica foi mais ou menos veemente em afirmar que ele foi oportunista. Juntou os hits do Pink Floyd, retomou um show que a própria banda já havia retomado há alguns anos, jogou duas de suas músicas solo no caldeirão, cantou mal, contratou músicos que providenciaram um “genérico eficiente”, não acrescentou nada à Música com “eme” maiúsculo. Ok, é prerrogativa do crítico musical julgar através de suas próprias idiossincrasias, experiências e preconceitos. Porém, se o show de Waters no Morumbi não trouxe nada à Música, trouxe muito aos fãs, principalmente àqueles que não tiveram a oportunidade de ver o Floyd em 70, e ele fez isso com maestria. Os músicos foram precisos e minuciosos; e Waters, com sua voz suave, bonita, mas limitada, não foi arrogante e dividiu os vocais com outros cantores para não assassinar Gilmour ou os ouvidos da platéia em certos momentos. O cuidado com tudo o que se via, ouvia e sentia era impressionante. Tudo se resume a isso: teve feeling. O show não foi mais um dos vários que têm aterrisado no Brasil para oferecer espetáculos robotizados para uma platéia que se contenta com pouco, com a simples presença de um alguém. Waters ofereceu um verdadeiro espetáculo para os sentidos e respeitou seu público, que saiu com a sensação de que o dinheiro, o tempo e a energia empregados para estar lá foi pouco perto do retorno que teve. Afinal, não é esse o intuito de um show?

terça-feira, 1 de maio de 2007

BAM BAM BAM

Os intelectualóides ranzinzas adoram dizer que não assistem Big Brother. Como não sou um deles, assisti ao último capítulo. Foi demais.

Na verdade, a TV estava ligada e eu não conhecia ninguém. Claro, só o Bial e o "nooosssooo heróóói" Alemão. Limão, para os íntimos (?). A festa comendo solta e eu achei que a moça cantando, a tal Cláudia Leite, era a tal Fani (ou Fany?). Fui me informar depois e vejam só minha ignorância: confundi a moça que casou virgem com a ninfomaníaca que pulou de pára-quedas vestindo uma cinta-liga vermelha. Diferença visível, não? Não?? Ora!

O Alemão ganhou e, já diria o torcedor popular, eu já sabia. Até os intelectualóides ranzinzas já sabiam. Tão fácil quanto sua vitória, é explicar o seu porquê; o personagem (!) reúne características estereotípicas daquelas dignas de novela das oito (ok, todo mundo já disse isso, mas elogio nunca é demais): machão popozudo, forte, pegadô, tatuado, filho pródigo, carismático, jogador, anjo, líder. E agora rico. Todo mundo queria ser o Alemão. Os controladores aéreos também. Ele, muito mais do que os ministros, é o nosso herói nacional.

Mas o Alemão é um cara divertido também. Ele até pulou na piscina quando descobriu que havia ganho a bolada. HAHAHA, que legal! E os críticos invejosos ficam escrevendo por aí que o cara não tem nada demais. Escondam-se, patifes! O Alemão é legal. O Alemão ama o pai, que é engenheiro civil, gosta de mulheres bonitas, de surfar e de freqüentar baladas. Se eu fosse um crítico invejoso, diria que também amo o meu pai, que também é engenheiro civil, também adoro mulheres bonitas e caio nas baladas sempre que posso... Pronto, eu provaria que ele é de carne e osso, como alguns chatos insistem em dizer por aí. Ah, eu não gosto de surfar (não sei, tanto faz). Eu trabalho. Ele não. Muito esperto, este Alemão. Se eu fosse um crítico invejoso, diria que os brasileiros sucumbem delirantes a um fantoche de filme pornô disfarçado. Mas eu não sou. Porque se eu fosse, diria que o Alemão nem é desse jeito, que ele foi criado com a ração que faz a audiência crescer, e o público, faminto, babava e gemia em frente à TV só pra ver se chegava mais perto deste germânico viril.

Quanta bobagem. A verdade que só 91% dos telespectadores perceberam é que este rapaz é um gênio. Mas é claro que é! O Alemão agradou a todos, a homens e mulheres. Aos primeiros, óbvio, porque conquistou duas gostosas. Às mulheres, ora, porque preferiu esperar pelo amor a gozar (!) com o sexo casual e todo o tesão da Cláudia Leite. Opa, da Fani (Fâni ou Faní, afinal?).

Quanta sacanagem, coisa feia, proibida para menores de 16 anos. Vi o último capítulo e tive saudades do ingênuo Bam Bam, o Kleber da primeira edição. Depois que ele chorou aquele choro de retorcer a cara inteira porque roubaram sua boneca de vassoura, votei cem vezes pra que ele ganhasse. Cem. Clique a clique. Ele sim foi o meu herói, mas, uma pena, quase nunca mais o vi. Fiquei muito desapontado quando conferi sua participação no programa do Didi e sua coreografia na propaganda daquele refrigerante nacional que estava ganhando o mercado da Coca-Cola (aliás, será que as coisas estão ligadas?). Minha decepção foi tão grande que não quis mais saber de novos heróis.

O Brasil, porém, ao contrário de mim, ainda quer. O Brasil é carente. Estou sozinho, pensando seriamente em me unir aos companheiros... aqueles... da crítica. Sabe como é. Os meus amigos invejosos e ranzinzas devem pensar como eu: e agora, que seremos de nós, leitores dos jornais que estampam a preocupação com o romance forjado entre o príncipe e a caipira? Siri com limão, sinceramente, me causa gastroenterocolite aguda, mas é o prato predileto dos especialistas em BBB; é a sugestão do dia, de segunda a sexta, da doutora Sônia Abrão e daquele outro gordo fantasiado de Mama alguma coisa. Bruschetta (e não foi o que eu disse, mas é exatamente como o que vocês pensaram). E para conquistarem mais credibilidade (?), levaram para o sofá mais um especialista: o ex-bbb P.A. (gadê?). Quéééim ?! Ah, se eu fosse um crítico invejoso eu diria que este P.A. nem ganhou um milhão pra ficar enchendo o povo de palpites ordinários.

Mas assistir à doutora também é reviver a infância: o outro companheiro diário dessa laia de oportunistas era o Décio Piccinini, aquele cara que sentava entre a Sônia Lima e o Pedro de Lara no show de calouros do Silvio Santos. Ele continua o mesmo, mas falta o pato magrelo passando embaixo da tela. Saudades do pato magrelo.

Mesmo depois de tanto tempo deste eterno último capítulo, a saga prossegue. “O Brasil pára para acompanhar o maior romance da atualidade”, me avisa a TV. Olho para o meu chefe na expectativa de que eu também possa parar, mas ele não diz nada. Retomo o trabalho de esgueiro no canal da Sônia Abrão. A repórter (?) sai às ruas com a enquete “O que você acha de homens que depilam o peito?”. O Alemão depilou, logo descubro. Envergonhado, abotôo a camisa até o fim para que ninguém veja o meu peito peludo. Sou um perdedor.

As notícias (?) seguem apontando a distância entre o Alemão e seus súditos, fãs ou o que quer que sejam. Atônito, penso como o Big Brother me excita, me provoca a escrever muita coisa sobre esta nave-mãe bialesca. Mas, resistindo ainda a me juntar a qualquer uma da partes, babões ou ranzinzas, vou assistir aos Flintstones, meus heróis que nunca me decepcionaram. BAM BAM BAM!!!! BAM.